quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

E. F. Caxias a Cajazeiras (1895-1919)
E. F. São Luiz-Teresina (1919-1975)
RFFSA (1975-1997)
CAXIASMunicípio de Caxias, MA
Linha tronco - km 372,642 (1960)

MA-3678

Inauguração: 05.04.1895
Uso atual: INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE CAXIAS - IHGC

com trilhos
Data de construção do prédio atual: c.1915

HISTORICO DA LINHA: A E. F. São Luiz-Teresina foi aberta em seu primeiro trecho em 1895, ligando Caxias a Cajazeiras (Flores). Em 1919 foi aberto outro trecho, São Luiz-Caximbos, prolongado em 1920 até Caxias. Somente em 1938 os trilhos chegaram a Teresina, com a abertura da ponte sobre o rio Parnaíba. Trens de passageiros rodaram até o ano de 1991 pela linha. Cargueiros trafegam por ela até hoje.

A ESTAÇÃO: A estação de Caxias foi inaugurada em 1895. A estação que aparece nas fotos abaixo é a "nova", construída nos anos 1910, quando a ligação de Caxias a São Luiz foi posta em tráfego. O antigo pátio, que possuía duas casinhas, hoje está abandonado. A casinha para trens de carga não mais existe. Para
ACIMA: Mapa mostrando o esquema da estação de 1915 (nova) e de 1895 (A, B, C e D), EM 2007. A casinha A já foi demolida; a B é a mesma da foto abaixo; a C é a base da caixa d'água e a D, o antigo galpão de manutenção, está hoje em ruínas. As linhas em pontilhado eram as linhas antigas, que terminavam nesse pátio, pois a linha não seguia para São Luiz. Com a abertura da ligação Caxias-São Luiz, a linha mudou de local e cruzou o rio Itapecuru; foi construída uma nova estação, de dois andares, que é a que ainda hoje está por lá. ABAIXO: A antiga estação de passageiros, que operou como tal de 1895 a 1920 (Foto e esquema Tarcioso Vilarinho, 2007).passageiros era usada a outra casinha. Dessa antiga estação, de 1895, hoje só ela existe, ao lado da base da caixa d'água e do galpão de manutenção, este em ruínas. "Acho que com o esquema anexo, feito às pressas, dá para entender como era antes e como é agora, ou seja: construíram a estação de dois pavimentos, situada antes da antiga (B), devido ao trem, a partir de então, seguir para São Luiz, entrando à direita" (Tarcisio Vilarinho, 2007). (Fontes: Guia Geral das Estradas de Ferro do Brasil, 1960; Guias Levi, 1932-1980; Edson Vidigal, 2000; Pedro Paulo Resende; Revista Brasil Ferrocarril, 1915; Tarcisio Vilarinho, 2007)




A estação em 1915. O novo pátio ainda não funcionava. Revista Brazil Ferrocarril, de 15/10/1915

A estação de Caxias, provavelmente anos 1920. Foto de autor desconhecido

Estação de Caxias em 1960. Acervo Tarcisio Villarinho

A estação em 2002. Foto Pedro Paulo Resende

Estação de Caxias em 2007. Foto Tarcisio Villarinho

Estação de Caxias em 2007. Foto Tarcisio Villarinho
Guajajara
Peter Schröder
Universidade Federal de Pernambuco
janeiro, 2002
  • Outros nomes:
  • Onde estão: Maranhão
  • População:
  • Família linguística: Tupi-Guarani
Introdução
Os Guajajara são um dos povos indígenas mais numerosos do Brasil. Habitam mais de 10 Terras Indígenas na margem oriental da Amazônia, todas situadas no Maranhão. Sua história de mais de 380 anos de contato foi marcada tanto por aproximações com os brancos como por recusas totais, submissões, revoltas e grandes tragédias. A revolta de 1901 contra os missionários capuchinhos teve como resposta a última "guerra contra os índios" na história do Brasil.
Nome
Além de guajajara, este grupo tem uma outra autodenominação mais abrangente, Tenetehára, que inclui também os Tembé. guajajara significa "donos do cocar" e Tenetehára, "somos os seres humanos verdadeiros". Às vezes, os guajajara traduzemTenetehára por "índio", excluindo desta categoria os grupos Jê, como os Canela, que são chamados àwà ("selvagens, bravos"). Não se conhece com certeza a origem do nome guajajara, mas provavelmente foi dado aos Tenetehára pelos Tupinambá. Tanto entre os próprios índios quanto na literatura científica, atualmente a denominação guajajara é mais usada do que Tenetehára.
Língua
A língua guajajara pertence à família tupi-guarani, sendo as línguas mais próximas o Asurini (do Tocantins), o Avá (Canoeiro), o Parakanã, o Suruí (do Pará), o Tapirapé e o Tembé, que lhe é muito semelhante. Os guajajara chamam sua língua de ze'egete ("a fala boa"). Ela é subdividida pelos lingüistas em quatro dialetos que são mutuamente inteligíveis, sem maiores complicações. Nas aldeias, o guajajara é falado como primeira língua, enquanto o português tem a função de língua franca, que é entendida pela maioria. A situação sociolingüística dos guajajara que moram nas cidades é desconhecida.
Localização
Todas as Terras Indígenas habitadas pelos guajajara estão situadas no centro do Maranhão, nas regiões dos rios Pindaré, Grajaú, Mearim e Zutiua. São cobertas pelas florestas altas da Amazônia e por matas de cerradão, mais baixas, sendo estas matas de transição entre as florestas amazônicas e os cerrados. Os guajajara nunca habitaram os cerrados vizinhos, região dos povos jê. Sua região mais antiga, historicamente conhecida, foi o médio rio Pindaré.
A partir do final do século XVIII e início do seguinte, expandiram seu território para as regiões dos rios Grajaú e Mearim, onde se estabeleceram pouco tempo antes da chegada dos brancos, disputando com vários grupos timbira as áreas de caça. Por volta de 1850, uma parte dos Tenetehára migrou para o norte e mais tarde passou a ser chamada de Tembé pelos regionais.


Terras Indígenas
Municípios
Extensão (ha)
Araribóia
Amarante, Grajaú, Santa Luzia
413.288
Bacurizinho
Grajaú
82.432
Cana-Brava
Barra do Corda, Grajaú
137.329
Caru
Bom Jardim
172.667
Governador
Amarante
41.644
Krikatí
Amarante, Montes Altos, Sítio Novo
146.000
Lagoa Comprida
Barra do Corda
13.198
Morro Branco
Grajaú
49
Rio Pindaré
Bom Jardim, Monção
15.002
Rodeador
Barra do Corda
2.319
Urucu-Juruá
Grajaú
12.697

As Terras Indígenas Araribóia, Bacurizinho e Cana-Brava abrigam cerca de 85% da população guajajara [dados de 2002]. Em várias terras, eles não são os únicos habitantes indígenas: há grupos dos Guajá em Araribóia e Caru, dos Tabajara em Governador e Rio Pindaré e dos Guarani, Krenyê e Kokuiregatejê em Rio Pindaré. Em duas Terras Indígenas os Guajajara são minoria: em Governador, dos Gavião-Pukobyê, onde representam cerca de 36% dos habitantes, e em Krikatí, onde há uma comunidade cujos moradores não falam mais a língua indígena. Na Terra Indígena Geralda/Toco Preto, dos Kokuiregatejê, antigamente registrada como terra dos Guajajara, só morava um único Guajajara em 2000.
Demografia
O número exato dos guajajara é desconhecido, pois as estatísticas da Funai são incompletas, ignorando várias aldeias. Segundo os dados da Funai, completados pelos do autor, existiam pelo menos 13.100 em 2000 apenas nas terras indígenas. O número dos Guajajara que vivem em cidades como São Luís, Barra do Corda, Grajaú, Imperatriz ou Amarante, no entanto, é desconhecido e nem há estimativas sobre ele.
Mércio Gomes estimou sua população, com base em cálculos comparativos, em 3.000 para a época dos primeiros contatos com os brancos. Em 1942 Charles Wagley e Eduardo Galvão a estimaram em 2.000 indivíduos. Depois Gomes calculou 2.500, 3.000 e 4.300 para os anos de 1942, 1953 e 1975 respectivamente. Faltam números exatos do crescimento atual, que é na faixa de 2,5% a 3,0% ao ano. Também faltam estatísticas sobre as taxas atuais de mortalidade infantil e de adultos, que não parecem ser menores que as da população rural regional, que ainda são altas.
Não há estatísticas referentes às uniões interétnicas e nem a seus descendentes. A forma mais comum destes casamentos não é, como se podia esperar, entre homens brancos e mulheres indígenas, mas o oposto, como são os homens que emigram para as cidades com maior freqüência, e são as mulheres solteiras que representam um tipo de "capital social" para as famílias, porque podem atrair genros e, com isso, trabalhadores masculinos para o grupo familiar.
Histórico do contato
Os guajajara têm uma história longa e muito singular de contato com os brancos. O primeiro contato pode ter acontecido em 1615, nas margens do rio Pindaré, com uma expedição exploradora francesa. Até os meados do século XVII, os Tenetehára foram assolados pelas expedições escravagistas dos portugueses no médio Pindaré. Esta situação mudou com a instalação das missões jesuítas (1653-1755), que ofereceram certa proteção contra a escravidão, mas implicaram um sistema de dependência e servidão.
Depois da expulsão dos jesuítas da Colônia pela Coroa, os Tenetehára conseguiram recuperar parte de sua antiga independência, reduzindo os contatos com os colonizadores. A partir de meados do século XIX, foram progressivamente integrados em sistemas regionais de patronagem, com todas as formas conhecidas de exploração extrema (como coletores ou remeiros, por exemplo). A política indigenista da época não articulava qualquer proteção contra estes abusos. Os guajajara, de vez em quando, reagiam violentamente, mas em geral permaneciam submissos.
A maior revolta, no entanto, foi causada por um empreendimento de missão e colonização dos capuchinhos, a partir de 1897, em Alto Alegre, na região atual de Cana-Brava. Em 1901, o cacique Cauiré Imana conseguiu unir um grande número de aldeias para destruir a missão e expulsar todos os brancos da região entre as cidades de Barra do Corda e Grajaú. Poucos meses depois, os índios foram derrotados pela milícia (composta de contingentes do Exército, da Polícia Militar, de indivíduos da população regional e de guerreiros Canelas) e perseguidos por vários anos, o que fez muito mais vítimas entre os guajajara do que entre os brancos. A revolta de Alto Alegre representa um dos incidentes mais importantes na história deste povo.
Novos conflitos sangrentos surgiram a partir dos anos 1960 e 70, com a expansão descontrolada de latifúndios no centro do Maranhão, empurrando muitos posseiros para dentro das Terras Indígenas. O maior palco destes conflitos foi de novo Cana-Brava, com o povoado ilegal de São Pedro dos Cacetes, que existiu de 1952 a 1995 e contra o qual os guajajara tiveram que resistir quatro décadas, com apoio apenas esporádico do Governo Federal. Outras ameaças surgiram a partir dos anos 1980, com o Programa Grande Carajás e com a cobiça de pequenas madeireiras regionais.
O contato com outras etnias indígenas - Guajá, Urubu-Ka'apor e vários grupos timbira, entre os quais os Canela - era tradicionalmente marcado por hostilidades. Apesar do fim dos confrontos armados, ainda existem ressentimentos interétnicos, particularmente contra os Canelas e os Guajá.
Atividades econômicas
A principal atividade de subsistência é a lavoura, sendo comum o plantio de mandioca, macaxeira, milho, arroz, abóbora, melancia, feijão, fava, inhame, cará, gergelim, amendoim. Na estação seca, de maio a novembro, são realizadas a broca, derrubada, queimada, coivara e limpeza, enquanto de novembro a fevereiro se faz o plantio e as capinas.
As áreas plantadas por unidade residencial geralmente são pequenas: atualmente elas variam entre 1,25 ha e 3,55 ha por unidade doméstica ou entre 0,25 ha e 0,71 ha por indivíduo, respectivamente. Esta variação depende principalmente do envolvimento das comunidades e dos indivíduos na comercialização de produtos agrícolas.
Algumas aldeias têm grandes roças comunais preparadas para projetos comunitários, para plantar arroz e frutas para a comercialização. Em muitas roças encontra-se uma planta ainda não identificada, chamada canapu pelos guajajara. Trata-se de um arbusto de cerca de 60 cm de altura que dá pequenas frutas amareladas, moles e cheias de pequenas sementes, de forma parecida a uvas. É interessante notar que esta planta não tem nenhuma função prática para os guajajara contemporâneos, mas eles relatam que era seu alimento em tempos míticos antes que Maíra, seu criador do mundo, os ensinasse a agricultura. É por causa desses relatos míticos que o canapu não é arrancado durante a "limpeza" da roça.
A pesca é mais praticada pelas aldeias ribeirinhas. Os guajajara costumam pescar cerca de 36 espécies diferentes, sendo o cará, o cascudo, a lampreia, o mandi, o pacu, o piau e a traíra as mais comuns. Nos últimos anos, no entanto, foram construídos, em diversos projetos comunitários, pequenos açudes perto de algumas aldeias que ficam distantes de rios. Para os moradores destas aldeias os açudes permitem tanto a pesca de subsistência quanto a comercial.
Durante as últimas décadas, a caça tornou-se uma atividade cada vez menos produtiva por causa da concorrência dos brancos e das limitações das áreas. Os guajajara caçam tradicionalmente mais de 56 espécies, sendo as mais comuns o caititu, a cutia, o jacamim, o jacu, a queixada e diversas espécies de macacos e tatus. Em uma parte das terras guajajara a caça voltou a ser mais produtiva durante os anos 1990 depois de iniciar controles mais eficientes dos limites das terras pelos próprios índios.
A coleta ainda é praticada por quase todos os guajajara. As atividades de coleta, no entanto, estão sendo substituídas cada vez mais pela fruticultura nas aldeias e roças. Atualmente os guajajara plantam cerca de 30 tipos de fruteiras e palmeiras. O único produto florestal ainda coletado em maiores quantidades para fins comerciais é o mel.
As relações econômicas com os brancos baseiam-se tanto em trocas materiais quanto monetárias. As fontes de renda mais comuns são a comercialização de produtos agrícolas, a venda de artesanato e trabalhos temporários (para os colonos) ou permanentes (para a Funai). Outra fonte de dinheiro é a venda de maconha, plantada tradicionalmente pelos guajajara. A maconha foi introduzida por escravos africanos no século XVIII e seu consumo ainda é uma parte integral da cultura indígena, mas sua venda gera conflitos muito sérios e violentos com as Polícias Federal e Militar.
Um problema muito grave é a comercialização predatória dos recursos naturais das áreas por concessões a madeireiras e caçadores, de modo a obter pequenos lucros em curto prazo para, por exemplo, comprar os remédios não fornecidos pelos serviços governamentais deficientes.
Organização social e política
Atualmente, as aldeias não mais tomam nenhuma forma típica: são compridas (ao longo de caminhos), redondas ou quadrangulares. Localizam-se de preferência à beira de rios ou, na falta de cursos d'água, perto de lagoas na mata. A proximidade de uma estrada pode ser outro fator atraente, para vender artesanato, por exemplo.
As aldeias, antigamente muito pequenas e de existência temporária, hoje em dia são permanentes e poucas vezes transferidas. Podem ser constituídas por uma única família, mas em alguns casos podem ter até 400 ou mais moradores. As casas, construídas no estilo regional camponês, em geral são habitadas por famílias nucleares. As aldeias costumam manter sua independência e poucas vezes formam coligações regionais, mas existem diversas relações de parentesco, matrimoniais e rituais entre as comunidades.
O sistema de parentesco e as formas de casamento destacam-se pela flexibilidade em estabelecer e aproveitar relações. A unidade mais importante é a família extensa, que é composta por um número de famílias nucleares unidas entre si por laços de parentesco. Trata-se, em essência, de um grupo de mulheres aparentadas e sob a liderança de um homem. Não há metades, clãs ou linhagens, nem qualquer direito ou obrigação que se transmita por uma linha de descendência específica.
A residência pós-núpcial é com os pais da mulher (uxorilocalidade), pelo menos temporariamente. Muitos chefes de família extensa procuram manter o maior número de mulheres junto de si, até adotando as filhas de homens falecidos que eles costumavam chamar de "irmãos". Eles tentam arranjar casamentos para essas moças para assim conseguir genros, que devem viver pelo menos um ou dois anos junto aos sogros, prestando vários tipos de serviço. Se o chefe de família tem bastante prestígio, consegue que os genros se fixem definitivamente com ele, aumentando, desse modo, o número de colaboradores e angariando co-partidários para formar uma facção na aldeia.
A chefia, sem regras fixas para se estabelecer, sofreu algumas mudanças com a política indigenista. Os principais critérios tradicionais para assumir a liderança (qualidades individuais e uma base de co-partidários por consangüinidade e afinidade) ficaram menos importantes, comparados com as exigências de saber lidar com o mundo dos brancos. Isto diz respeito, em primeiro lugar, à capacidade de se relacionar com os órgãos governamentais e tirar vantagens disto para a comunidade local, e à qualidades individuais (conhecimentos do português e talento diplomático, entre outras).
Cada aldeia tem seu próprio cacique ou capitão, mas há aldeias com mais de um por causa das rivalidades entre várias famílias extensas. Alguns caciques tentam estender sua influência às aldeias vizinhas, mas sua autoridade é muito instável e pode ser contestada a qualquer instante pelos concorrentes da própria aldeia. Neste jogo pelo poder, o órgão indigenista costuma intervir para promover seus próprios protegidos, que podem ser personagens fracos, sem base verdadeira nas aldeias.
Relações de gênero
As relações de gênero estão marcadas por desequilíbrios em favor dos homens, o que se manifesta principalmente na política e na educação: lideranças costumam ser masculinas e a educação para os meninos é mais liberal do que para as meninas. Nas esferas econômica e cosmológica, as atividades femininas estão mais relacionadas com a agricultura do que as masculinas, mais voltadas para a caça.

A tradicional divisão sexual do trabalho hoje em dia não está mais tão bem definida quanto antigamente, restando cada vez menos atividades tipicamente "masculinas", que atualmente apenas são a caça e o preparo da lavoura. As mulheres ainda não conseguiram conquistar a arena política, ficando à margem das reuniões e continuando a influenciar os homens na esfera doméstica. Nas relações sexuais, são principalmente as mulheres que costumam tomar a iniciativa.

Quanto aos nomes pessoais , atualmente predominam os cristãos-portugueses. Geralmente, só as pessoas acima de 60 anos ainda têm nomes indígenas.
Cultura material
Os guajajara abandonaram grande parte de sua cultura material tradicional, ainda produzindo um pouco da cestaria e redes de dormir para uso doméstico e comercialização. Com os incentivos da Funai a partir dos anos 1970, os guajajara voltaram a produzir arte plumária, adornos, armas e cestaria, lembrando-se de padrões antigos e imitando modelos de outros povos indígenas, finalmente criando um novo estilo próprio que hoje em dia pode ser identificado com facilidade. Desse modo, os guajajara também voltaram a usar pintura corporal, por ocasião tanto de festas e rituais como de manifestações políticas.
Cosmologia, mitologia e ritos
Cosmologia, mitologia e ritos.A cosmologia tradicional é típica dos povos tupi-guarani, distinguindo-se quatro categorias de seres sobrenaturais, que recebem a designação genérica de karowara: (1) os criadores ou heróis culturais, responsáveis pela criação e transformação do mundo, sendo Maíra e os gêmeos Maíra-ira e Mucura-ira os mais importantes e Zurupari, o criador das pragas e dos insetos, das cobras peçonhentas e aranhas, um herói cultural muito temido; (2) os "donos" das florestas (Ka'a'zar), das águas (Y'zar), das caças (Miar'i'zar) e das árvores (Wira'zar), que são hostis e muito temidos por seu poder maligno; (3) os azang, espíritos errantes dos mortos, também muito temidos; e (4) os piwara, espíritos de animais. Muitos guajajara não acreditam mais nestes seres, por causa das atividades missionárias.
A mitologiauma mistura de motivos tupi, europeus e africanos. Há, por exemplo, um mito com o motivo da Gata Borralheira e a figura do Zurupari. Existem três categorias principais de mitos: (1) mitos de heróis culturais; (2) mitos que apontam uma moral; e (3) mitos de animais. Em todos os mitos registrados até agora, destaca-se o papel de Maíra. Um mito muito importante para explicar o mundo do ponto de vista dos guajajara é o dos gêmeos Maíra-ira e Mucura-ira.
O motivo mítico dos gêmeos é comum entre diversos povos tupi. Para os Guajajara eles são heróis culturais, ao lado de Maíra-pai, embora não tenham o mesmo pai. Enquanto Maíra-ira tem origem divina, Mucura-ira tem origem animal, como seu pai.
O mito relata sua odisséia por um mundo cheio de desafios e perigos, desde os primeiros momentos dentro da barriga da mãe até o encontro final com Maíra. O maior desafio é sua sobrevivência entre as "onças", que são canibais e matam a mãe dos dois, mas s os gêmeos se vingam delas brutalmente. No decorrer dos anos, os dois aprendem superar todos os perigos naturais e supernaturais, mas Mucura-ira sofre mais devido a sua natureza "humana".
O mito é cheio de alusões à vida cotidiana dos Guajajara e explica grande parte de seu mundo, como, por exemplo, a "condenação" dos guajajara à agricultura por Maíra por causa de algum "pecado original", como um momento de desconfiança dos poderes de Maíra por parte de uma mulher. Mas ele também pode ser interpretado em termos dos conflitos apresentados e superados como representação mítica dos conflitos dentro da sociedade guajajara e com outros povos.
Os grandes rituais tradicionais estão em decadência por muito tempo. Antigamente, o mais importante era a Festa do Mel (zemuishi-ohaw), realizada em setembro ou outubro, durante a estação seca, e que exigia vários meses para ser preparada. Ela desempenhava um papel muito importante nas boas relações entre as aldeias, mas atualmente é celebrada raramente e apenas em poucas aldeias.
A Festa do Milho (awashire-wehuhau), também chamada a "festa do pajé", realizava-se todos os anos na época das chuvas, durante o período de crescimento desse vegetal. Seu propósito era garantir uma boa colheita e proteger o milho contra as ações dos azang. Por isso, sua principal característica era a pajelança.
O rito do Moqueado, realizado na mesma ocasião como parte da Festa do Milho, marcava o final da puberdade para os adolescentes participantes. O Moqueado ainda é praticado em intervalos irregulares, mas tornou-se meio profano, muitas vezes só restando a parte culinária do rito para acompanhar reuniões políticas.
Entre as causas principais do abandono dessas festas figuram a falta de tempo para prepará-las e realizá-las, considerando a integração dos guajajara na economia regional, além do esquecimento de muitos cantos xamânicos.
O ciclo de vida de uma pessoa ainda costuma ser acompanhado por uma série de rituais. Entre estes, os rituais de iniciação, em particular os das meninas, são os mais vistosos e ricos de significados. Além disso, há uma série de rituais para pedir permissão a Maíra para plantar, a Miar'i'zar para caçar e a Y'zar para pescar.
Xamanismo
O xamanismo também está em decadência. Em algumas aldeias nem existe mais. Antigamente, a maioria dos homens tentava, a qualquer custo, ser pazé, mas poucos tinham sucesso e ganhavam fama. O poder e a reputação dos pajés dependiam do número de seres sobrenaturais que eles sabiam "chamar". Pajés muito reconhecidos podiam se tornar também líderes poderosos.
A pajelança é uma atividade quase exclusivamente masculina. A função principal dos pajés ainda é curar e celebrar as festas de Maíra e da "mesada", um ritual de oferendas em favor de pessoas doentes. A pajelança costuma ser vista como ambígua, porque os poderes dos xamãs podem ser usados para objetivos tanto positivos quanto negativos.
Nota sobre as fontes
Os textos etnológicos têm focalizado os Guajajara, sem exceção, sob o prisma do contato interétnico, a começar pelo livro de Charles Wagley e Eduardo Galvão, Os índios Tenetehára, publicado primeiramente em inglês, baseado em pesquisa de campo realizada nos anos 1940, que aborda sua cultura em transição para o modo de vida sertanejo. Neste estudo clássico da Etnologia Indígena os dois autores prognosticaram equivocadamente o desaparecimento dos Guajajara como grupo diferenciado para os anos 1960.
Mércio Gomes, por sua vez, nos anos 1970, em sua tese de doutorado, defendida na Universidade da Flórida, examinou, à luz de uma análise marxista, a história das relações dos Guajajara com os brancos desde o período colonial e apresentou uma teoria para explicar a persistência da sua cultura.
Na década de 1980 concentram-se os artigos de Edson Diniz, que se referem uns aos outros, repetindo os autores já referidos, sem nenhuma contribuição inovadora. Mais recentes, os trabalhos de Peter Schröder apresentam principalmente a situação dos guajajara no final dos anos 1980 e nos anos 90. Ele publicou sua tese de doutorado, defendida na Universidade de Bonn, na Alemanha, sobre a formação de um movimento político entre os guajajara (1993), usando uma abordagem multicausal.
O livro O filho de Maíra (1997), de Carlo Ubbiali, do CIMI-MA, é uma apresentação subjetiva e muito política da cultura guajajara por meio de uma abordagem biográfica, descrevendo principalmente a vida de uma liderança. A monografia mais recente é a dissertação de mestrado de Cláudio Zannoni, defendida na Uesp de Araraquara e publicada em 1999 com o título Conflito e coesão:o dinamismo tenetehara. Nela, Zannoni dá enfoque na mitologia e nos rituais para entender melhor o dinamismo da sociedade guajajara face aos conflitos com os brancos. Espera-se em breve o lançamento da tese de doutorado de Elisabeth Coelho, da UFMA, defendida em 1999 na UFC e que trata do conflito de São Pedro dos Cacetes.
O livro Cauiré Imana, de Olímpio Cruz, descreve num estilo ficcional o levante guajajara contra a missão dos capuchinhos, em 1901. Sobre a língua guajajara há principalmente os trabalhos de David Bendor-Samuel, Max Boudin, Carl Harrison.Peter Schröder elaborou uma bibliografia exaustiva sobre os Guajajara.
Em 2002, foi lançado um livro sobre a história do conflito entre os Guajajara da TI Cana Brava e a população do extinto povoado de São Pedro dos Cacetes e seus aliados:Territórios em confronto: a dinâmica da disputa pela terra entre índios e brancos no Maranhão, de Elizabeth Maria Beserra Coelho.
Existe um filme documentário sobre o conflito de Alto Alegre. Nos documentários de Jürgen Diekert e Jacob Mehringer sobre os Canela, mostrados na Alemanha e pela representante regional da rede Globo em São Luís, há muitos trechos com os Guajajara.
Fontes de informação
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